
Alguma vez pensaste como queres nascer como Mãe?
O meu bebé nasceu numa cesariana marcada com antecedência e com direito a anestesia geral. Não por minha escolha, mas por impossibilidades reais de ter um parto normal. Mas a verdade é que quando me começaram a falar da probabilidade de ter de ser uma cesariana eu senti algum alívio e desejei que o cenário não mudasse.
Esta semana falamos de nascimentos no meu grupo de parentalidade. Pode parecer um tema normal para ser abordado num contexto como este, e é, mas não da forma como nós o fizemos. Foi totalmente fora da caixa, para mim, pelo menos, que sou um ser aferradamente racional. Ou talvez já não, talvez cada vez menos. Foi lindo, transformador e imensamente curativo.
Falamos de nascimentos reais e simbólicos, dos nossos e dos nossos filhos, e do nascimento conjunto que estamos a experienciar. Mas houve um momento que me marcou mais do que qualquer outro e é esse que eu quero aqui partilhar.
No meio de algo que já não me lembro nem preciso de recordar, escutei a voz suave da Lindsey, como que a murmurar para não rebentar de tanto amor: «Eu adoro nascimentos, eu adoro tudo o que esteja ligado a nascimentos, são momentos únicos. No parto da minha filha tinha uns anjos comigo, a sussurrar “tu estás a fazê-lo, tu estás a fazê-lo”, a cada contração repetiam “tu estás a fazê-lo”».
Enquanto ela contava a sua experiência os meus olhos encheram-se de lágrimas. Verdadeiras lágrimas de futilidade, de tristeza pela experiência que me tinha sido roubada. Nada, mesmo nada, na história do nascimento da minha filha se parece com a experiência dela. Mas será que me foi mesmo roubada?
O meu bebé nasceu numa cesariana marcada com antecedência e com direito a anestesia geral. Não por minha escolha, mas por impossibilidades reais de ter um parto normal. Mas a verdade é que quando me começaram a falar da probabilidade de ter de ser uma cesariana eu senti algum alívio e desejei que o cenário não mudasse.
Não tinha que sofrer, não tinha que enfrentar o medo de passar por um parto vaginal, não tinha que escolher, não tinha que sentir.
Pois é, era assim a minha vida por esta altura, adormecida, fugindo do sentir. Sempre tinha sido assim e parecia-me que estava muito bem. O que eu não sabia, pelo menos ainda, é que não há como fugir da nossa verdadeira natureza.
Podemos reprimi-la, mesmo quando ela teima em espreitar a cada esquina, mas nunca aniquilá-la ou deixá-la totalmente para trás.
E escondida debaixo da máscara que eu nem sabia que usava, bem enterrada no fundo de um vulcão que me custava o mundo manter fora de erupção, estava o desejo antigo, talvez mais antigo que eu própria, talvez tão antigo como o inicio da humanidade ou do próprio universo, de ser mãe de forma natural.
A minha verdadeira natureza ansiava pela oportunidade de atravessar o portal transcendental que é dar à luz um filho sem drogas nem intervenções.
Uma mulher que se torna mãe é como uma lagarta que se transforma numa borboleta. Não é que não fosse linda e especial só como mulher, nada disso, mas por muito belas que consideremos as lagartas não há como negar que o ficam muito mais uma vez metamorfoseadas.
Ser mãe, transformar a mulher, a menina em nós na progenitora de outro ser, implica a passagem de um portal que é também feito de sofrimento. É o nosso casulo. E não há como fugir a isso. Podemos tentá-lo, como eu o fiz durante mais de 3 décadas, podemos até consegui-lo, mas a verdade é que nunca saberemos os custos devastadores desse sucesso até que ele se torne num insucesso.

Nascer como Mãe: parto natural ou cesariana?
Nascer como mãe implica sofrimento. E por vezes penso que a forma mais leve de o experienciar é a que a natureza tão sabiamente nos destinou: através do parto natural.
Mas voltemos a mim e à minha história. Como é que eu sei que na minha verdadeira natureza estava o desejo de um parto natural? Porque ela nunca parou de tentar dizer-mo, de me enviar sinal atrás de sinal, eu é que estava tão adormecida que nunca os consegui perceber.
Quando era menina e conseguia ter privacidade, coisa fácil na vida de uma filha única, gostava de fingir que estava grávida e acabava de entrar em trabalho de parto, passava horas nesta brincadeira, era sempre um parto muito demorado.
Sempre que via na televisão uma mulher a dar à luz o meu corpo acordava para a vida, e o desapontamento era tremendo quando cortavam as cenas das dores maternas. Quando soube que a minha filha ia nascer de cesariana senti alívio, mas também senti morrer um bocado de mim, um grande pedaço que ainda não recuperei totalmente.
Na primeira semana após o parto do meu bebé tinha muitas dores, que iam e vinham em períodos de tempo, foram piorando ao longo dos dias e terminaram comigo novamente no bloco operatório.
Quando me explicaram a causa e me disseram que “as dores que tinha eram contrações” não consegui controlar o choro, uma chama de alegria iluminou, por instantes, o meu peito enquanto que o meu coração me dizia “pelo menos conseguiste chegar a saber o que são contrações”. E logo veio a minha mente “que ridículo Márcia, as coisas que tu inventas, ganha juízo, olha se alguma vez alguém sabe disto.”
Pois é, esta é a minha história, de como eu descobri o que queria bem depois da escolha feita.
Mas o que é que isto tem a ver contigo? Simples, quero advogar o teu direito à escolha. Não estou aqui para te dizer que o parto vaginal e sem drogas é o melhor, que mudes de ideias se estás a pensar numa cesariana ou numa epidural. Jamais, não faz parte de quem sou.
O que eu pretendo é só colocar uma simples questão: Como é que tu queres nascer como mãe?
Já escutas-te a tua verdadeira natureza? Se ela te diz “cesariana” ou “epidural”, então segue o teu coração. Sim, há estudos que demonstram que para o bebé o melhor nascimento, o que lhe trás mais vantagens, é um parto vaginal e sem drogas.
Mas eu atrevo-me a ir mais longe: o que cada ser humano precisa é de uma mãe que se conheça e se aceite tal como é, que ame até as suas imperfeições, que faça as suas escolhas em consciência e conhecimento de si, de quem é. Com uma mãe dessas as desvantagens tornam-se forças e uma criança aprende a valiosa lição de que uma vida verdadeiramente bela não existe sem imperfeições.
Mas se pensas que a tua verdadeira natureza te diz “parto natural” e logo os teus medos, imensos e incontroláveis, te atiram ao chão em convulsões, então pára, respira, volta a respirar, e escuta: existe um batalhão de pessoas, bem perto de ti, que te podem ajudar a tornar o teu sonho realidade.
E mesmo que no final percebas que sempre queres uma epidural, uma cesariana, está tudo bem, ninguém te julga, ninguém te critica. Bem pelo contrário, continuámos a admirar-te imensamente pois já conseguimos vislumbrar a borboleta que há em ti.
Sabes, às vezes o portal, o casulo é simplesmente percebemos o que realmente queremos e aceitá-lo tal como é, possível ou impossível. Por isso é que a partilha da Lindsey finalmente libertou a borboleta que há em mim.