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Parentalidade consciente, disparos inconscientes e um momento de clarividência

Peguei no computador o mais rápido que pude e deixei as palavras fluir por entre os dedos que se fundiam com as teclas, sem consciência real do que escrevia, ainda de mente racional apagada e pasmada pela força do inconsciente.

 

Na parentalidade consciente aprendemos que é essencial criar um espaço, um tempo entre o momento em que estamos para disparar contra os nossos filhos e o disparo em si mesmo.

É essa mesma a base do movimento de parentalidade consciente: aprendermos a não agir de acordo com os nossos impulsos, ser capaz de avaliar a perigosidade do alvo antes do disparo.

Mas como qualquer mãe ou pai que já o tenha experimentado, este é um dos assuntos de que é muito mais fácil falar do que fazer.

Muitas são as técnicas oferecidas para ajudar nesse processo, desde o Mindfulness até aos Mantras, passando por exercícios de respiração ou até o Método de Tapping. Tudo o que funcione para travar o disparo.

O que eu adotei foi a prática do Colo Seguro da minha mentora de longa data Leslie Potter.

Fosse por a minha filha ser ainda muito nova quando comecei a trabalhar com a Leslie, fosse por eu estar tão defendida que nem os disparos conseguia sentir, a verdade é que só muito recentemente senti necessidade de ter um Colo Seguro físico no que diz respeito aos comportamentos da minha princesa.

E só então compreendi realmente o seu poder!

Parentalidade consciente: O perigo dos disparos inconscientes

Um dia dei por mim a gritar com a minha princesa e a descarregar nela toda a minha fúria. Para ser honesta já nem me lembro qual o gatilho, que comportamento dela me havia irritado tanto (e acertado em cheio nos meus disparos, para ser mais exata).

Só sei que tive consciência que precisava de parar. Dei um passo atrás, ainda a gritar, e sentei-me no meu Colo Seguro. Chamei a minha menina interior, que claramente dava as cartas naquele momento, e pedi-lhe com carinho que me mostrasse o que se passava.

Na segurança que criamos ao longo destes anos ela não hesitou em o fazer. E eu pasmei de choque perante o que vi!

Peguei no computador o mais rápido que pude e deixei as palavras fluir por entre os dedos que se fundiam com as teclas, sem consciência real do que escrevia, ainda de mente racional apagada e pasmada pela força do inconsciente.

 

E pelo poder da prática do Colo Seguro. E assim criei este texto que pode ler agora em baixo:

 “Quem me dera saber pintar. Ou pelo menos simplesmente desenhar. Pois se eu conseguisse fazê-lo esboçava agora um quadro de uma menina magoada, tão ferida que apenas sente ter duas opções: atacar ou morrer.

De estrutura frágil e sentimentos profundos, esta criança de apenas 5 anos encontra-se despida, caída na clareira de uma floresta, no centro de um círculo formado por adultos fortemente armados.

Já tudo deu, até a própria alma, e nada foi suficiente. No rosto dos crescidos vê aqueles que mais ama, aqueles que era suposto protegerem-na. De arco e fecha em punho estes disparam sem parar. A menina enrosca-se cada vez mais, aninhando-se sobre si mesma e protegendo a cabeça com as próprias mãos.

E os adultos disparam, disparam. Mil flechas que correspondem a mil ordens, pedidos, necessidades por satisfazer. Tão absorvidos que estão nas suas próprias dores, inseguranças e sensações de invisibilidade, atiram flecha após flecha, sem qualquer noção de que o que detêm na mão são armas mortíferas e que a menina está encurralada e a morrer.

De repente, sem saber bem como, a pequena pousa os olhos num dos membros da tribo que a maltrata. Não é um adulto mas sim outra criança que dispara o arco. As flechas mal saem direito e quase que não atingem a nossa protagonista. Mas ela vê aqui uma oportunidade de escapar, uma última oportunidade de viver.

Atira-se com raiva e poder sobre a outra criança. Desta vez é ela a agressora cega e de força desmesurada, desprovida de empatia, apenas guiada pela necessidade de sobreviver. Atira, bate, pontapeia, grita e aparentemente libera-se do ciclo de atacantes.

Para para respirar um pouco, recuperar o folgo e a compostura. Já se sente mais a salvo. Já consegue respirar. Olha para si e percebe que com a distância então criada é agora uma mulher e não mais uma criança renegada.

Olha para trás por uma última vez, para o grupo que agora parece mais confuso que zangado, mais desorientado do que agressivo, tão perdido como ela.

E no chão, morta por si, pela sua própria fúria, pelo desespero de salvar a própria vida num momento em que se sentira criança, vê aquela a quem jurara para sempre proteger: a sua própria filha!”

 

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