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O que é que eu quero do meu companheiro?

E foi assim, na minha procura de melhorar como mãe que percebi o quão precisava de crescer como esposa e mulher. Estava na hora de parar de apontar o dedo, criticar, culpar e julgar e passar a olhar para a minha própria imaturidade.

 

O que é que eu quero do meu companheiro?

Ser vista, escutada, compreendida. Ser aceite e amada tal como sou, sem críticas nem tentativas de mudança.

É simples, é básico, é o que qualquer ser humano deseja. Então também é o que ele anseia! E eu sou capaz de lho dar?

Sim, claro que sim. Não, claro que não.

Durante quase uma década e meia pensei que era a companheira perfeita, aquela a quem ele tantas vezes não sabia dar o devido valor. E depois fui mãe e tudo se transfigurou.

Foi belo vê-lo transformar-se em pai. Enquanto eu sobrevivia numa cama de hospital ele encarregava-se de tudo, tratava da nossa bebé com um amor que penso que nem ele sabia que era capaz de dar.

E foi ainda mais elucidativo e enternecedor verificar como mesmo após a distância física se instalar nas nossas vidas de novo, aquele pequenino ser, acabado de nascer, se manteve ligada ao progenitor e primeiro cuidador, sorrindo a cada reencontro, a cada nova chegada, a cada sinal da sua voz, como se ele nunca tivesse partido, como se nunca existisse semana.

E eu? Eu sentia-me de rastos, incapaz de funcionar. Eu só queria colo, conforto, carinho, alguém que me aliviasse a carga, alguém que alterasse o rumo da Minha História.

Eu queria o meu companheiro do meu lado, a cuidar de mim enquanto eu cuidava da nossa filha, a tratar de mim enquanto eu tratava da nossa princesa, a atender todas as minhas necessidades e caprichos. Eu queria que a cada fim-de-semana que ele passava em casa compensasse a sua ausência, me desse descanso e me tratasse como a sua rainha.

Eu queria sentir-me incondicionalmente apoiada. Eu sentia ser esse um direito meu, como mãe, esposa e mulher. Eu sinto ser esse um direito de todas as mulheres, mães, esposas. O que eu não compreendia é que ele não tinha mais para dar. O que eu não entendia é que me tinha casado com um ser humano, com os seus próprios medos, expectativas, limites e cansaço. E não com o super-homem.

 

Apenas um mês e meio depois de a nossa guerreira nascer o meu marido, oficial de carreira, iniciou o curso de Estado-Maior. Algo bem exigente, quase tão exigente como a própria maternidade. Mas se agora o consigo ver e comparar, na altura estava cega para tudo o que não fossem as minhas dores e necessidades e o difícil desempenho do meu novo papel de mãe.

Não havia tempo, capacidade e até mesmo vontade para me dedicar a ele como antes. Era eu que precisava de receber atenção. E se tudo isso é válido e real, não é menos verdade que ele também precisava de apoio, carinho, conforto e descanso.

A cada novo fim-de-semana ele corria para casa, para a sua família, o seu porto seguro. E o que o esperava era um cenário de guerra, críticas e ultimatos. Mas eu não o conseguia ver, nem ele o entender.

Fotografia de Rodrigo Lima

Foi um período difícil, uns anos de um conflito que parecia interminável. Perdiam-se batalhas, abriam-se feridas sem tempo para curar as anteriores, sujavam-se as armas sem intervalos para as limpar.

E o meu foco, a minha dedicação, continuava a ir completa para a maternidade. Procurei entender a minha filha, que parecia tão diferente de todos os outros bebés. Procurei descobrir-me como mãe, crescer, amar-me, compreender-me. Procurei até ajuda profissional.

E de repente comecei a conseguir ver. Não totalmente, apenas um breve vislumbre de cada vez. De repente comecei a escutar o que ele há muito me tentava dizer: “Ei, eu estou aqui, eu estou aqui para ti, eu quero ajudar-te, eu quero apoiar-te, mas por favor baixa as armas e deixa-me respirar. Eu não sou perfeito, nunca fui e provavelmente nunca o vou ser, mas eu amo-te e amo a nossa filha, por favor, tens de acreditar. Eu quero-te ver, escutar, entender, mas baixa as armas, deixa-me entrar. Se te fechas como uma fortaleza como é possível eu te conhecer? Se atacas como uma leoa como é possível eu me mostrar?”

E foi assim, na minha procura de melhorar como mãe que percebi o quão precisava de crescer como esposa e mulher. Estava na hora de parar de apontar o dedo, criticar, culpar e julgar e passar a olhar para a minha própria imaturidade.

Como é que alguém pode perceber o que eu preciso se eu não o pedir e informar? Como é que alguém há de me conseguir ver, escutar e compreender se eu não mostro o meu verdadeiro ser?

E eu? Sou capaz de ver, escutar e compreender o meu companheiro? Estou a começar, a aprender, a sincronizar. Estou, finalmente, a amadurecer e a perceber que quase nada na vida é preto e branco. Estou, por fim, a integrar e a compreender a beleza de viver num mundo de cinzentos.

 

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