
Onde está a minha vida?
Frustração. Hoje sinto-me frustrada. Por vezes fico louca de frustração. Tenho um objetivo, quero realizar algo… e ando semanas para o conseguir.
Se não é um impedimento é outro e tudo o que me apetece fazer é lançar a louça ao ar, partir algo, gritar e espernear. Não estou a falar de fazer algo complicado. Estou a referir-me a conseguir ver um filme até ao fim, escutar duas horas de classes online, ter uma conversa de meia hora no messenger ou escrever um texto sem ser interrompida.
Estou a falar em conseguir fazer algo que antigamente realizava em pouco tempo, num pestanejar de olhos, mas que agora sinto que demoro semanas para conseguir. E isto se correr bem, se não acabar mesmo por desistir. É isto que é ser mãe? É este o custo da maternidade? É este o preço de ter uma família? Sinto-me frustrada, sinto-me sozinha, sinto-me esquecida e abandonada. Onde está a vila de que tanto se fala que uma mãe precisa? Onde está o apoio? Onde está a minha vida?
Onde está o meu espaço? Onde está a minha independência, o meu descanso, a minha paz de espírito? O que faço com os meus sonhos, os meus desejos, as minhas aspirações? De que mais preciso de abdicar?
Estou revoltada, estou magoada, apetece-me gritar.
ONDE ESTÁ A MINHA VIDA?
Está aqui mesmo. Por detrás de uma porta que me custa o mundo abrir. Está aqui mesmo, por debaixo de uma pele que preciso de libertar.
Assim que deixar cair a posição de vítima e sentir a futilidade de tentar mudar o que não é passível de ser mudado eu renasço e recupero a minha existência. Mas o problema é que essa é uma mudança tão vulnerável como contra intuitiva na sociedade em que vivemos. É bem mais fácil partir alguma coisa, gritar com alguém, encontrar culpados.
Sabem porque escrevo? Porque assim fujo de realmente sentir a futilidade e a responsabilidade de ser adulta. Pelo menos desta vez (vá, admite lá, e muitas outras) escrever não é integrar ou amadurecer, mas sim prolongar o meu sentimento de coitadinha e continuar a tentar mudar algo.
Ora deixem-me entreter o meu sentimento de impotência que se quer armar em superior: “Estás frustrada. Sentes-te impotente. Então vá lá a fazer algo positivo com isto. Vamos lá escrever e ajudar alguém. Vamos lá a dar a volta e transformar esta situação em algo positivo.”
Tretas. Puras tretas. Posso enganar-me e sentir-me melhor porque afinal sempre consegui mudar algo, realizar algo, encontrar o meu espaço.
Mas sabem o que ficou por fazer? O que após 40 anos de vida ainda fujo de realizar: sentir a futilidade do que não consigo mudar. Sentir a tristeza, a desilusão, a paralisia que advém da verdadeira consciência das limitações minhas e dos outros. Sentir que há muros intransponíveis nesta vida e que tudo o que podemos fazer é chorar a sua existência.
Onde está a minha vida? Por detrás do luto do que queria que ela fosse.
Onde está a minha vila, o meu apoio? Por detrás do luto de como queria que eles fossem.
Onde está a minha independência, o meu espaço, a minha realização pessoal e a minha paz de espírito? Por detrás do luto da criança que já não sou e que preciso deixar morrer.
Todos temos dificuldades com a mudança, é uma característica bem conhecida da condição humana. E isso é apenas porque sentir a futilidade e viver o luto do que já não é mais dói demasiado. E quanto mais fugimos desta dor mais ela se acumula e mais difícil se torna então senti-la.
E se parássemos de fugir? E se escolhêssemos sentir, mesmo que pareça que nos vai matar? Quantas depressões deixariam de existir? Quantos divórcios não precisariam mais de ocorrer? Quantas lágrimas se transformariam em sorrisos? E quantas crianças teriam pais emocionalmente saudáveis?